De repente, velha aos vinte: como estamos cada vez mais preocupadas com a idade, cada vez mais cedo

Por Clara Drummond

É importante que você, mulher, saiba de uma coisa, e não se esqueça dessa coisa: você é velha, você está caminhando para a meia-idade, ou para a terceira idade, enfim, para uma vida sem desejabilidade – mesmo que você, no momento em que lê essas palavras, tenha apenas vinte anos, ou até menos. 

A mensagem acima parece um pouco dura, mas, acredite, é isso que as marcas de skincare querem que você pense, pois o lucro dessas empresas depende da sua insegurança. Hoje, a geração Z gasta mais com skincare que qualquer outra faixa etária. Em 2012, menos de 20% das mulheres americanas entre 18 e 24 anos gastavam dinheiro com produtos anti-idade. Em 2018, esse número pulou para 50% (os dados foram tirados de uma reportagem da CNN). Ao que parece, não é satírica, e sim verossímil, a cena de Euphoria em que Cassie gasta três horas numa rotina extenuante de cremes e maquiagem antes de ir para a escola.

Nos últimos anos, o rótulo “anti-idade” tem sido questionado por alguns setores da sociedade. Em 2017, a Allure, revista da Condé Nast dedicada a produtos de beleza, anunciou que deixaria de usar o termo em suas reportagens. Da mesma forma, várias empresas de cosméticos mudaram a forma que anunciam seus produtos, optando por eufemismo como “renovação” e “retorno”. É uma mudança superficial e simbólica. O ageísmo é a galinha dos ovos de ouro da indústria da beleza – no ano passado, o lucro foi de mais de 100 bilhões de dólares!

A impressão é que atualmente toda celebridade e influencer tem sua marca de maquiagem ou skincare. Millie Bobby Brown lançou sua marca, Florence by Mills, com apenas 15 anos. Kylie Jenner tinha 18 anos quando lançou a Kylie Cosmetics. Kim Kardashian, sempre inovadora, fez um registro de patente a fim de lançar uma marca de cosméticos para sua filha, North West, de 9 anos.

 

Portanto, a indústria acena para a linguagem politicamente correta enquanto caminha para a direção oposta. Antes, os produtos elaborados para o público adolescente buscavam resolver questões relacionadas a acne. Agora, essa faixa etária se preocupa com rugas. Segundo a agência de tendências WGSN, há um novo tipo de consumidor chamado “skinvestors”, que enxerga skincare como um investimento. O objetivo é prevenir as rugas antes mesmo que elas apareçam. O botox preventivo – ou baby botox – realizado em pessoas entre 20 e 28 anos aumentou 34% entre 2010 e 2018. 

A toxina botulínica é uma substância relativamente segura. Os riscos de pessoas cada vez mais jovens fazendo o procedimentos não são físicos, e sim psicológicos. O botox tem duração de cerca de três meses, a partir daí, começa a desaparecer, e é preciso colocar mais, o que pode ter um efeito potencialmente viciante. É só avistarmos o menor sinal não apenas de uma ruga, mas de uma linha de expressão, que corremos para a reaplicação, gerando assim uma tolerância cada vez menor com “defeitos”. E não só em relação ao botox. A questão se alastra para procedimentos estéticos em geral. Afinal, quando a nossa testa deixa de ser um problema, passamos a prestar atenção nas outras partes do rosto, encontrar defeitos que antes eram imperceptíveis, e por aí vai. De acordo com a American Society for Aesthetic Plastic Surgery, o botox é mais utilizado por mulheres entre 22 e 40 anos que por mulheres com mais de 60 anos. 

É preciso que tenhamos em mente que quem anuncia esse tipo de produto não está preocupada com a nossa felicidade, autoestima ou conta bancária: o importante é o lucro de uma indústria que se beneficia das nossas inseguranças. 

Se as redes sociais atrofiam a nossa sensibilidade, a literatura aflora. Por isso, achei que seria bonito encerrar esse artigo com um trecho deste belíssimo romance de Marguerite Duras, O Amante. “Muito cedo foi tarde demais em minha vida. Aos dezoito anos, já era tarde demais. Entre os dezoito e os vinte e cinco anos, meu rosto tomou um rumo imprevisto. Aos dezoito, envelheci. Não sei se isso acontece com todo mundo, nunca perguntei. Acho que me falaram dessa arremetida do tempo que às vezes nos atinge quando atravessamos as idades mais jovens, as mais celebradas da vida. Esse envelhecimento foi brutal.” 

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