Sex and the City completa 25 anos, e o figurino de Patricia Field permanece atual, brilhante e mal compreendido

Por Clara Drummond

Essa semana, no dia 6 de junho, “Sex and the City” completa 25 anos desde sua estreia. E não há melhor presente que a notícia que Kim Catrall / Samantha Jones vai voltar para o reboot, “And just like that” (mesmo que para uma mísera cena). De tudo que já foi escrito sobre a série, cabe aqui uma ode a um dos seus elementos mais célebres e mal compreendidos: o figurino brilhante de Patricia Field. 

 

A primeira coisa que nos vem à mente quando pensamos no figurino de “Sex and the City” são os sapatos Manolo Blahnik. Em seguida, ocupando o segundo lugar do pódio, vem o modelo Baguette, da Fendi. A série não só colocou no mapa o designer de sapatos espanhol como também ajudou a ressuscitar a grife italiana. Last, but not least, “Sex and the City” foi um dos precursores do high-low como tendencia predominante durante o início dos anos 2000. As peças caríssimas usadas pelas personagens eram constantemente usadas em conjunto a outras, mais baratas. O termo – que também aparece numa grafia mais informal, hi-lo – era onipresente em qualquer publicação de moda da época. De repente, era imprescindível que todo look fosse composto uma peça cara e outra bem baratinha – de preferência, uma peça de brechó, mas, com o tempo, fast-fashion também passou a valer (embora não costumasse constar no figurino da série). A grande dupla dinâmica da moda durante a virada do milênio era essa: uma peça de um dígito combinada a uma peça de quatro dígitos.

Está aí a primeira má-compreensão do figurino de “Sex and the City” – compartilhada até mesmo por seus produtores. De repente, o programa passou a virar sinônimo de cada vez mais ostentação, mesmo que essa fama não fosse exatamente justa, pelo menos durante seus anos iniciais. Na medida que o tempo passava, o elemento low foi ficando cada vez mais esquecido, e o high passou a ser cada vez mais high, a ponto dos filmes da franquia (terríveis, diga-se de passagem) serem um espetáculo grotesco de mal gosto e wealth porn. Ainda por cima, quando foram lançados, o zeitgeist já havia mudado, pois passou a ser considerado mau-gosto tamanha ostentação diante da crise econômica de 2008. 

O elemento talvez mais subestimado do figurino é sua grande contribuição para o humor da série. No episódio “Boy, Interrupted”, Samantha Jones assume a identidade de Anabelle Bronstein para frequentar a piscina na Soho House. O esquema só é bem-sucedido por pouco tempo, o suficiente para que ela possa aproveitar a piscina, flutuando em cima de uma boia, com seu maiô recortado, enormes óculos escuros brancos, maxi-pulseiras e… um par de escarpins de salto alto! Como Sam conseguiu subir em cima da boia com esse par de sapatos permanece um grande mistério. 

Já em “Frenemies”, a promiscuidade de Samantha é contrastada com o puritanismo de Charlotte. Depois de uma briga, cada uma encontra outras amigas, mais de acordo com seus estilos de vida: Samantha se une Claire Anne, uma mulher mais velha com o mesmo apetite para sexo, e Charlotte reencontra suas amigas da faculdade que também se casaram, Sydney, Stephanie e Meg. Em outra produção, poderia soar preguiçoso e óbvio vestir uma personagem conservadora com cardigan, pérolas e tons florais, assim como uma personagem sexualmente livre usando decotes profundos e bijuterias chamativas. Mas “Sex and the City” é uma comédia, que se permite ser over the top se o resultado fizer rir, e pode abusar de exageros e clichês que flertam com o camp. 

Não é para ser realista. “Sex and the City” não é um drama, não é uma cine biografia, nem um filme histórico – e até mesmo esses trabalham com o chamado suspension of disbelief. Ou seja, para melhor aproveitar qualquer obra de ficção, seja no cinema, na televisão, na literatura ou no teatro, é preciso abrir mão de pensar com a mesma lógica que pensamos a vida real. “Sex and the City” trabalha com personagens arquetípicas: a romântica, a piranha, a workaholic. As coadjuvantes também se encaixam em categorias propositalmente rígidas, não são bem personagens, e sim símbolos sociológicos: as mulheres casadas do subúrbio, as mulheres da alta sociedade, as mulheres mais jovens, as mulheres mais velhas, a mulher perfeita, mas vanilla, que está com o homem dos seus sonhos. E o figurino se diverte com isso. 

Além do mais, “Sex and the City” nunca se pretendeu realista, a começar pela própria premissa: que mulher escreveria no jornal sobre os segredos íntimos e sexuais de suas melhores amigas? E, detalhe, sem sequer mudar os nomes, nem disfarçar detalhes! No mínimo, somente isso geraria um tanto de conflito, mas nunca presenciamos qualquer discussão sobre esse tipo de invasão de privacidade. E tudo bem, é ficção, o objetivo é fazer sentido dentro daquele universo ficcional, não no nosso universo. Não precisa ser realista, e sim minimamente verossímil. 

Por isso, também não é necessário que exista perfeita coerência entre o closet e o salário de Carrie. As roupas de uma personagem servem para traduzir sua personalidade e estado de espírito, não sua conta bancária. E, ainda assim, Carrie Bradshaw é uma celebridade, seu rosto está estampado no ônibus, ela é tem fãs, é reconhecida nas ruas, desfila para a Dolce & Gabbana. Portanto, mesmo se aplicássemos um critério de ultrarrealismo para analisar o valor financeiro do seu closet, precisaríamos levar em conta as peças que lhe foram dadas de presente, tal qual acontece com as influencers dos dias atuais. 

Podemos fazer isso, é lógico. Mas é mais interessante aproveitar o melhor de Patricia Field e “Sex and the City”: diversão e inspiração. 

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